Emanuel Laguna 14 anos atrás
O seguinte episódio pode agradar a quem não gosta de lidar com padrões proprietários e fechados de software: lá na Coréia do Sul, um país conhecido pelos MMORPGs da NCsoft e pela bela Hwang Mi Hee, a maioria das compras e transações bancárias ainda são efetuadas pelo Internê Explorer 6.
Não, vocês não leram errado: o jurássico navegador do Windows XP é a principal forma de internet banking no país da família Samsung. Haja estrelas douradas, para darem boa sorte aos cidadãos sul-coreanos que queiram apenas pagar as contas do mês sem transformar o computador numa máquina zumbi…
Esclarecendo melhor a situação e parte de algumas piadas: no final dos anos noventa, o SSL a 40 bits fôra considerado inseguro pela Agência Coreana de Segurança da Informação, o que levou o governo sul-coreano a desenvolver um algoritmo próprio de encriptação para a segurança das transações e pagamentos online.
Assim nascia o SEED, como um plugin para o Netscape e na forma de um controle Active-X, para também funcionar no Internê Explorer. Isso por volta de 1998.
Como o navegador da Microsoft venceu o Netscape na “guerra dos browsers” e o Windows foi e continua sendo o sistema operacional presente em 99% dos computadores sul-coreanos, o governo lá foi esquecendo de atualizar a tal semente da segurança, confiando que a querida Microsoft manteria o suporte ao Active-X nas futuras versões do Internê Explorer…
Para o leitor que estiver meio perdido no tiroteio: o Active-X era uma ferramenta desenvolvida pela empresa do tio Bill Gates, lançada no longínquo 1996, para uso exclusivo do IE. Muitos dos webdesigners eram encorajados a desenvolverem websites melhor visualizados em algum Internê Explorer, afinal ele era (e ainda é!) o navegador líder em audiência.
O problema do tal Active-X é que alguns de seus controles (e isso inclui o SEED…) requerem acesso total ao sistema operacional, detalhe que na mão dos esforçados crackers é um prato cheio para a disseminação dos vírus, malwares e outros programas que também comprometam o sigilo e o controle do usuário sobre seu querido PC.
Voltando ao sul da península coreana: no belo momento em que a Microsoft começou a corrigir tal problema de segurança do Active-X, restringindo o acesso ao sistema pelos controles Active-X a partir do IE7, os sul-coreanos (mesmo os usuários do Linux e/ou os Mac-users) se viram obrigados a manterem o IE6 em suas máquinas para fazer compras e outros pagamentos, o que explica boa parte do fracasso na adoção do Windows Vista, naquele país.
Nem imagino o trabalho adicional que os webdesigners coreanos têm para adequar os websites ao IE6: tal navegador nem deve ser compatível com figuras em PNG, que muitos websites devem usar para fundos transparentes, por exemplo. Dois webdesigners coreanos, Victor Ching e Brian Lee, que o digam: descontentes com diversos atrasos para tornar o website deles compatível com o IE6, decidiram fazer um abaixo-assinado para o governo matar, executar expulsar o IE6 daquele país. Pretendem 1 milhão de assinaturas e já conseguiram 1.143, até o momento. Pode parecer pouco, mas qualquer um no mundo pode assinar tal petição, desde que entenda coreano.
E tudo isso por conta de o governo sul-coreano apostar num padrão proprietário e fechado, que funciona apenas com um navegador e, devido ao ‘abandono’, trabalha “melhor” numa antiga versão dele…
É, realmente, um triste exemplo do que pode acontecer quando a web é construída com padrões proprietários e fechados: no momento em que a empresa e/ou instituição mantenedora não possui o interesse em continuar o desenvolvimento, o aperfeiçoamento de um projeto, ele simplesmente morre. E também pode deixar todo um país, tido como o líder no acesso à banda larga, com uma década de atraso na indústria da internet.
Fontes: The Korea Times, através do Raju Bitter e Mozilla Links, via Alt1040.
*Devo observar que o termo “internê” é o meu JEITINHO carinhoso de apelidar a internet.